A Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) organiza anualmente um
vestibular concorrido, é pioneira em ações afirmativas e tem três
programas de pós-graduação com nota máxima da Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) do Ministério da
Educação. A tradição e o prestígio da instituição, no entanto, têm
convivido com falta de recursos, que vem paralisando trabalhos e pode
desmotivar jovens pesquisadores.
Segundo
o sub-reitor de Pós-graduação e Pesquisa da Uerj, Egberto Moura, R$ 32
milhões aprovados para pesquisas em 2016 não foram repassados via
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj), o
que tem levado laboratórios e grupos de pesquisa a suspenderem
atividades.
"As coisas estão começando a parar em graus variados.
Alguns laboratórios também têm recursos de agências federais e
estaduais [de outros estados], mas está ficando muito difícil, porque o
grande financiador da pesquisa no Rio de Janeiro é a Faperj", afirma o
sub-reitor. "A gente teme que esse pessoal novo que trabalha em áreas de
ponta se desmotive e comece a sair da universidade".
Um
exemplo dessa situação é o convênio com a Organização Europeia para a
Pesquisa Nuclear (Cern), no qual um supercomputador é mantido em
funcionamento na Uerj para auxiliar no processamento de dados gerados
nos experimentos com aceleradores de partículas. Entre os temas que
movem os cientistas envolvidos no projeto está a origem do universo e a
formação da matéria.
O equipamento que protege o supercomputador
de oscilações de energia (nobreak) quebrou em novembro, e sem dinheiro
para substituí-lo, a universidade teve que paralisar parte da pesquisa,
que envolve instituições de todo o mundo. Um nobreak custa R$ 450 mil,
mas a falta do aparelho pode causar prejuízo de aproximadamente R$ 5
milhões se o computador for ligado sem segurança. "A universidade perde
prestígio se não consegue manter um sistema funcionando e rompe o
contrato com o Cern, por mais que pesquisadores brasileiros continuem
participando como associados", lamenta o sub-reitor, que considera a
crise na Uerj a pior que já vivenciou, por afetar os segmentos de
ensino, pesquisa e extensão.
O
supercomputador pode voltar a funcionar com uma doação que está sendo
acertada com o Comitê Rio 2016, que utilizou um nobreak semelhante nos
Jogos Olímpicos e Paralímpicos. No entanto, ainda não há previsão para
que seja religado.
Outro projeto afetado pela falta de recursos é
a construção de um prédio para o Centro de Estudos Multidisciplinares
de Obesidade. O edifício de um pilotis e três andares receberia até mil
pessoas por semana para pesquisa sobre obesidade por profissionais de
várias especialidades, com acompanhamento de mudança do estilo de vida,
avaliações físicas, psicológicas e conscientização.
A diretora do
centro, Eliete Bouskela, conta que a obra começou em 2013 e parou em
2015. Enquanto não fica pronta, o número de atendimentos não passa de 80
por mês, e a abordagem multidisciplinar é prejudicada pela falta de um
espaço adequado. "Praticamente todas as nossas pesquisas estão sendo
afetadas. Estão faltando insumos básicos", disse a diretora, que lidera
um grupo que tinha cerca de 40 pesquisadores. "Perdemos três doutores
que foram para o exterior".
No Instituto de Biologia, o professor
associado Israel Felzenszwalb conta que faltam recursos de editais
aprovados nos últimos dois anos. "Isso vem dificultando trabalhos de
tese de doutorado e dissertação de mestrado e causa uma desmotivação que
pode acarretar em, no futuro, não termos recursos humanos", disse o
professor, que pesquisa na Uerj há mais de 45 anos. "É a maior crise que
já vi a Uerj atravessar. De cada tijolo que foi posto na pesquisa, eu
fiz parte, e é muito triste ver que isso pode desmoronar", afirmou,
acrescentando estar otimista para que a situação melhore.
A falta
de recursos nos laboratórios, exemplifica o professor, impede a
pesquisa de musgos extraídos na Antártida que podem guardar propriedades
farmacêuticas e dermatológicas e interfere no monitoramento da poluição
da região metropolitana do Rio. "A coisa mais impactante foi não
estarmos recebendo os salários de novembro, dezembro e décimo terceiro.
Isso é uma afronta".
Assim como muitos servidores do estado, os
professores, pesquisadores, bolsistas e técnicos da Uerj estão sem
receber os vencimentos integrais desde novembro. Bolsistas da Faperj em
outras universidades também estão sem receber. O décimo terceiro e o
salário de dezembro não foram pagos, e os funcionários temem sobre o
pagamento do salário de janeiro.
Segundo o sub-reitor, a Uerj não
recebe os R$ 13 milhões mensais de custeio desde agosto, e pagamentos
de empresas terceirizadas e contas como energia elétrica e água estão
atrasados.
A Secretaria de Estado de
Fazenda reconhece que, "em meio à gravíssima situação financeira do
estado", foi repassado 65% do orçamento total da Uerj em 2016.
"Como
o salário de dezembro e o décimo terceiro salário ainda não foram pagos
para a maioria do funcionalismo público do Estado do Rio de Janeiro,
encontram-se pendentes de pagamento R$ 212,4 milhões em pessoal, que
representam 18,9% do orçamento total da Uerj. Em custeio e investimento,
ficaram pendentes de pagamento R$ 83,9 milhões, que representam apenas
7,5% do orçamento total da universidade", diz a nota da secretaria.
Sobre
a Faperj, a secretaria informou que o valor pago pela fundação à
pesquisa em diversas instituições foi de R$ 445,9 milhões em 2015 e de
R$ 267,5 milhões até novembro de 2016. O órgão não detalhou quanto
desses recursos eram da Uerj e qual deveria ter sido o repasse.
Fonte: Agência Brasil, em 11/01/2017.
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