sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Não se trata de salvar o povo, mas de salvar o euro

O problema não é a complexidade da crise, mas a democracia. O que os políticos mais temem nesses momentos é que os substituamos, que roubemos deles esse poder delegado que mantêm, por um mecanismo controlado de eleições entre opções enquadradas nos limites do sistema, e legitimadas pela mídia.

Na realidade, não se trata de salvar o povo, mas de salvar o euro, como se fossem a mesma coisa. Por que tanto interesse? E de quem? Porque dez dos 27 membros da União Europeia vivem sem o euro e algumas de suas eco nomias (Reino Unido, Suécia, Polônia) são muito mais sólidas que a média da União Europeia? Defender o euro até o último grego é a primeira linha de defesa para uma moeda que está condenada porque expressa economias divergentes e que não têm um estado que a respalde. Com Portugal e Irlanda na UTI, a Espanha na corda bamba, e uma Itália em permanente crise política e endividada até o pescoço de seu ex-líder, a defesa franco-germânica do euro tem outras explicações.

A primeira razão é obvia: salvar os bancos, principalmente os alemães e franceses, que emprestaram sem gara ntias para a Grécia e aos demais PIGS (Portugal, Itália, Grécia e Espanha) mediante a manipulação de contas praticada, pelo menos no caso da Grécia, pela consultoria da Goldman Sachs (certamente, deve ser simples coincidência que Draghi, o novo presidente do Banco Central Europeu também foi empregado da Goldman Sachs).  De início, já aceitam que precisarão esquecer 50% da dívida da Grécia. Mas os outros 50% têm que ser tirados do sangue, suor e lágrimas dos gregos, para que o não pagamento não acabe impune.

Quebram os países para que os bancos não quebrem. Mas por que se faz isso? No fim, os Merkozy [Merkel e Sarkozi] não são funcionários dos bancos. Têm seus interesses políticos, nacionais e pessoais. A Alemanha necessita realmente que o euro seja a moeda europeia e que seus sócios não possam desvalorizá-la. Porque o modelo de crescimento alemão é na realidade, o mesmo que o chinês: crescer por meio de exportações favorecidas por uma moeda subvalorizada. Se houvesse um euro-marco forte, a Alemanha perderia mercados na Europa perderia competitividade em relação a exportações espanholas ou italianas.

Mas há outra dimensão político-pessoal. Tanto Merkel quanto Sarkozy precisam estabelecer sua liderança europeia por razões de política interna e por projeto de grandeza nacional que é preciso disfarçar, para não despertar velhos fantasmas. E as outras elites políticas europeias? O sentimento de serem europeus, em um mundo em mudanças desde a América do Norte até a Ásia, dá-lhes a impressão de ser algo mais que produtos aldeanos do aparato de partido que tanto desprezam.

E o sonho europeu? Ele pode ser construído com as pessoas, amando-nos uns aos outros, em vez de ver quem para a conta. Quando pensar em euro, pense fraude. Quando pensar em Europa, pense amigos.

Fonte: La Vanguardia, em 20/11/2011.

Nenhum comentário:

Postar um comentário