O Plano Nacional de Educação (PNE), que determina diretrizes, metas e estratégias para a
política educacional, chega ao seu quarto ano de vigência com apenas um dos
dispositivos cumprido integralmente e avanços em apenas 30% naqueles previstos
para os anos de 2015, 2016, 2017 e 2018. O balanço foi realizado pela Campanha
Nacional pelo Direito à Educação em parceria com o Laboratório de Dados
Educacionais da UFPR.
O único
dispositivo cumprido, com atraso, foi a publicação de estudos pelo INEP para
aferir a evolução das metas a partir de informações organizadas por ente
federado e consolidadas em âmbito nacional. O documento, no entanto, é alvo de
críticas. Segundo a Campanha, o investimento em educação, explicitado na
avaliação da Meta 20, que trata sobre financiamento, apresenta valores em
relação ao PIB somente até 2014.
Outro ponto é que o relatório não apresenta dados desagregados
por investimento por ente federado, essencial por revelar como foram os gastos
federais direto em educação nos últimos anos, “mostrando que o Governo Federal
não tem feito sua parte no aumento dos investimentos em educação, ao contrário
de estados, DF e municípios”, avalia a Campanha.
O balanço também pontuou o descumprimento de dispositivos-base
previstos na Lei do PNE, fundamentais para o cumprimento do Plano. “O Plano
Nacional de Educação foi organizado como uma agenda progressiva, o que
significa que seus dispositivos estão dispostos em um cronograma, com tarefas
atribuídas para cada um dos dez anos. Se uma tarefa agendada para 2015 não for
feita, ela prejudica o cumprimento de outra agendada para 2016, 2017 e assim
por diante”, explica o coordenador da Campanha, Daniel Cara.
Entre os atrasos
figuram, por exemplo, a instituição do Sistema Nacional de Educação, previsto
para 2016, dois anos após a aprovação da Lei, e que seria responsável por
promover articulação entre os sistemas de ensino, em regime de colaboração,
para efetivação das diretrizes, metas e estratégias do PNE.
Na mesma situação encontram-se as estratégias 20.6, 20.7, 20.8,
20.9, 20.10 e 20.11, que compõem a meta 20 de financiamento, e tratam da
implementação progressiva do Custo Aluno Qualidade
inicial (CAQi) e do Custo Aluno Qualidade (CAQ), instrumentos
que preveem um padrão mínimo de financiamento da educação, de modo a garantir
qualidade em sua oferta; além do estabelecimento de um regime de colaboração,
em que a União se responsabiliza a complementar financeiramente Estados,
Distrito Federal e municípios que não alcançarem o valor mínimo do
financiamento projetado.
Os atrasos, segundo especialistas, seguramente impactam no
cumprimento das demais metas do Plano e dificultam a possibilidade do País de
reparar a histórica trajetória de atraso educacional no que diz respeito à
garantia do direito a uma educação de
qualidade na educação básica e no ensino superior.
“Ainda temos 2,8 milhões de crianças
e adolescentes fora da escola, o que é gravíssimo. Outro ponto é que
o PNE se configura em um período em que a pirâmide etária brasileira tem a
maior parte da população na base, ou seja, são crianças e adolescentes.
Garantir o direito à educação é necessário para que eles se desenvolvam
plenamente e atuem futuramente pelo desenvolvimento do País”, atesta Andressa
Pellanda, coordenadora de políticas educacionais da Campanha.
O professor do
Departamento de Planejamento e Administração Escolar da UFPR, Thiago Alves,
pontua que o Brasil está muito abaixo da média dos países desenvolvidos em
relação a população economicamente ativa que conclui um curso de graduação. “O
Brasil tem em torno de 14% dessa população, enquanto a média dos países da OCDE
é de 33% e outros como Estados Unidos, Japão e França superam os 40%”, observa.
Fatores
políticos e econômicos
Para Pellanda e Alves, o Plano Nacional de Educação é escanteado
por uma conjunção de fatores políticos e econômicos. Um deles é a Emenda
Constitucional 95, que estabelece um teto aos gastos públicos por 20 anos e
“segue na contramão do
previsto pela legislação do Plano”, na opinião de Andressa, que relembra que o
PNE prevê um aumento progressivo do financiamento da educação até 2024, com
patamar de 7% do PIB para a educação em 2019 e 10% ao final do decênio. Hoje, o
Brasil está no patamar de 5,5% do PIB, segundo o INEP. A emenda Constitucional,
por sua vez, prevê o congelamento dos gastos até 2036.
A
medida, segundo a especialista, deve impactar também o próximo Plano Nacional
de Educação que ainda nem foi formulado. “Aumentar o financiamento da educação
é estritamente necessário pra conseguirmos cumprir o Plano. Sem isso, não vamos
conseguir abrir mais vagas, necessárias para incluir todo mundo na escola, fora
o fato de que precisamos melhorar a qualidade da educação para os estudantes
que estão na escola hoje, o que também passa pelo financiamento”, adverte
Andressa.
Nesse contexto,
o Plano prevê, via CAQi, a implementação do piso do magistério,
além de investimentos na formação docente, na estrutura das escolas e na
relação professor aluno, com vistas a menos estudantes por sala de aula.
Fora do espectro econômico, pesam sobre o descumprimento do
Plano Nacional de Educação algumas decisões políticas, como pontua Thiago
Alves. “De 2014 para cá temos questões decorrentes de uma mudança inesperada de
governo, fora do curso das eleições, que causa uma instabilidade e não permite
colocar a educação como uma pauta prioritária”, pondera.
As políticas educacionais pautadas pelo atual governo como a Reforma do Ensino Médio e
a Base Nacional Comum
Curricular para a etapa também divergem do teor do PNE, segundo
Andressa. “Não temos garantidos os insumos de qualidade necessários, como
financiamento e valorização de professores e nem a dimensão de uma nova
pedagogia, como pleiteada pelos estudantes durante as ocupações das escolas”,
garante.
Os especialistas reforçam a necessidade de um arranjo
institucional entre municípios, estados e União para que o regime de
colaboração, já previsto na Constituição Federal, saia do papel. “O Plano
Nacional de Educação é complexo, mas necessário, e carece de consensos e pactos
mínimos”, conclui Thiago.
Fonte: Carta Capital (Educação)
em 15/06/2018.
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