As medidas nacionais de matrícula indicam que a escolaridade média da população, no período entre 1990 e 2010, aumentou de 5,6 para 7,2 anos. Sem dúvida, temos de comemorar esse resultado, que coloca o Brasil em posição de vanguarda em relação a outros países. Esse artigo, ainda que superficialmente, pretende levantar questionamentos sobre possíveis peculiaridades que ainda possam estar ocultas nos atuais índices nacionais de melhoria da educação.
Por exemplo, qual seria a porcentagem de alunos matriculados que estão atualmente na escola? As discrepâncias entre a oferta de educação básica entre regiões do país e entre a área urbana e a rural ainda estão presentes? A porcentagem de professores leigos e o analfabetismo continuam mais concentrados no Norte e no Nordeste e nas áreas rurais do país? Essas questões se justificam porque os atuais resultados numéricos também têm a função de legitimar políticas governamentais para a educação.
O bom resultado numérico da permanência na escola também serve para amenizar padrões muito frágeis de autonomia local, isto é, circunstâncias nas quais os estados e municípios têm posição fraca em relação à política educacional do Estado central. Hoje, mais do que nunca, escolas e universidades estão expostas a fatores perversos, tais como crimes, drogas, corrupção, ausência de cultivo de valores para formação dos alunos, salários inadequados, presença de ideologias falidas no ambiente escolar.
Além disso, muitos professores se interessam mais pela militância política do que por sua missão de educar. Como consequência, alguns professores e alunos contrários a esse comportamento sentem sua liberdade de pensar manietada pelo pensamento único advindo da ideologia. Esses fatos não têm tido lugar nos debates educacionais.
Portanto, quando a expansão da escolaridade é comemorada, há que se levar em conta a qualidade da expansão. O aumento de vagas nas universidades e escolas é considerado uma benesse do governo para os que sonham entrar nessas instituições públicas e gratuitas. Em vista disso, é lícito perguntar se é justo oferecer vagas na universidade para pessoas que alegam pobreza ou discriminação racial sem levar em conta a qualidade de seu desempenho educacional anterior.
É consensual entre estudiosos que o Brasil tem necessidade premente de formar profissionais competentes em todos os ramos do saber para que venha a ser um país desenvolvido. Já é tempo de os professores em sala de aula e acadêmicos nas universidades se darem as mãos, com a convicção de que quanto melhor for a qualidade da formação dos professores nas universidades, melhor será a educação básica em nosso país. Desse modo, pessoas menos favorecidas, por várias razões, poderão entrar na universidade por mérito e vocação.
Conciliar quantidade e qualidade na educação não é um problema somente brasileiro. É um problema mundial. Alguns países conseguiram realizar a façanha. Hoje, a ciência oferece meios para mudar cenários educacionais que, durante muitas décadas, resistiram à mudança. Recentemente, um grupo de analistas acadêmicos do Canadá, dos Estados Unidos e da Inglaterra conceberam um modelo teórico, fruto de longas observações de sistemas educacionais resistentes à mudança. Assim, eles conseguiram provar que a mudança somente é possível quando os níveis nacional, estadual e municipal do governo têm um foco sistêmico em relação à educação. Países como Coreia do Sul, Singapura e Finlândia devem seu sucesso na educação, em parte, a esse modelo.
Finalmente, é necessário e prazeroso registrar recentes casos no Brasil nos quais o aumento da escolaridade aparece ligado à qualidade da educação em cidades interioranas de regiões pouco dotadas economicamente. São escolas de excelente qualidade no Vale da Ribeira, Nova Horizonte, Sud Menucci e Arealva, no estado de São Paulo. Além disso, escolas de alto nível no interior do Piauí. Segundo recentes pesquisas, o traço comum nessas escolas é a notável competência dos diretores e professores, aliada à clara vocação para a tarefa de educar.
Ignez Martins Tollini é mestre em educação brasileira (UnB) e em ciências da educação (Universidade de Purdue, Indiana, EUA), Ph. D em educação (Universidade de Londres, Reino Unido). Artigo de Ignez Martins Tollini, publicado no jornal Correio Braziliense, em 23/06/2011.
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