No Brasil, o filho do rico
estuda na universidade pública, e o do pobre vai para a particular. Este é
provavelmente um dos clichês mais repetidos em conversas sobre o perfil dos
estudantes no ensino superior no país, mas basta olhar as estatísticas do IBGE
para derrubá-lo.
A renda média por pessoa no
domicílio de um universitário em instituição pública no Brasil é de R$ 1.189,
segundo tabulações feitas pela coluna na Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios) de 2012, a última disponível. Entre os alunos de instituições
particulares de ensino superior, esse valor chega a R$ 1.332, ou 12% a mais.
Essa diferença não é nova — um dos primeiros especialistas a identificar o
quadro foi o sociólogo Simon Schwartzman — e já foi maior. Em 2001, corrigindo
valores pela inflação do período, um aluno do ensino superior privado tinha
renda média per capita em sua casa de R$ 1.672, ou 33% a mais do que o
verificado entre universitários de instituições públicas (R$ 1.259).
Na comparação entre 2001 e
2012, é possível identificar que, apesar de ainda ter um perfil de
universitário com renda um pouco superior ao das públicas, foi no setor
particular em que houve maior queda na renda média de seus alunos,
provavelmente por efeito do ingresso de alunos mais pobres com bolsas do ProUni
e crédito estudantil.
Se é falso afirmar que os
alunos da rede pública são mais elitizados que os da particular, por outro
lado, pode-se dizer que é o curso — e não a instituição — o que mais diferencia
ricos e pobres em seu ingresso no ensino superior. A constatação disso pode ser
feita a partir do questionário do Enade, exame aplicado pelo MEC em
universitários de todo o país. No curso de licenciatura em Letras, por exemplo,
apenas 22% dos estudantes do setor privado informaram ter renda familiar
superior a seis salários mínimos, percentual muito parecido ao verificado no
setor público para o mesmo curso: 17%. Já entre os alunos de Engenharia, o
percentual de mais ricos pelo mesmo critério chega a 63% no setor privado e 58%
no público. Ou seja, alunos de Engenharia, não importa onde estudem, têm renda
média muito superior ao dos que frequentam Letras.
Por fim, pela Pnad, mesmo
considerando que os dados de renda tendem a ser subestimados nesse tipo de
pesquisa, é possível calcular um dado que sempre se apresenta em discussões
sobre financiamento do ensino superior: quantos no setor público poderiam
pagar? Se fossem aplicados os critérios do ProUni para alunos da rede federal,
52% receberiam bolsas integrais, ou seja, estudariam de graça. Outros 28%, por
ter renda familiar entre 1,5 e 3 salários mínimos per capita, seriam elegíveis
a bolsas de 50%. Por fim, 20% dos alunos da rede federal, aqueles com renda
familiar superior a 3 salários mínimos per capita, não receberiam bolsa nenhuma
do governo.
Numa conta simples, supondo
que apenas esses 20% de alunos mais ricos (194 mil no total) pagassem algo como
R$ 1.000 por mês (pouco para cursos que concentram os mais ricos como Medicina,
Engenharia, Odontologia...), as universidades federais arrecadariam num ano
cerca de R$ 2,3 bilhões. Não resolve os problemas de financiamento do setor,
visto que o MEC gastou em 2012 R$ 26 bilhões para manter sua rede federal de
educação superior, mas seriam recursos que, se bem utilizados, poderiam melhorar
as condições de ensino para aqueles que mais precisam.
Fonte: O Globo, em 0/9/2014.
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