As ocupações de escolas mudaram a forma de os estudantes se
manifestarem, deram força à categoria e mostraram a necessidade de os
estados se reinventarem na relação com a comunidade escolar, de acordo
com especialistas ouvidos pela Agência Brasil. As ocupações de escolas
por secundaristas começaram no ano passado em São Paulo e se estenderam
para outros estados - Espírito Santo, Rio Grande do Sul, Mato Grosso,
Rio de Janeiro, Goiás e Ceará.
As pautas específicas de cada
localidade variam, mas o movimento tem uma demanda comum: educação
pública de qualidade. "As ocupações mostram que no Brasil está havendo
uma articulação de vários segmentos contra a incapacidade do Estado de
prestar um serviço como deveria ser", avalia o cientista político e
sociólogo da Universidade de Brasília Antônio Testa.
Segundo
Testa, essa insatisfação começou a ganhar as ruas na jornada de
protestos de junho de 2013. "Os movimentos mostravam que a população
estava insatisfeita com transporte, educação e segurança. A sociedade
está se mobilizando, tem internet para ajudar e está mostrando que
consegue pressionar o Poder Público para as suas razões".
De
acordo com ele, as novas formas de manifestação também exigem dos
governos novas formas de negociação. Os movimentos são pulverizados, não
têm uma única liderança. Na maioria dos estados, os estudantes pedem
que as negociações ocorram com pelo menos um representante de cada
escola ocupada. "O estado tem que mudar a estratégia, é sempre reativo,
não tem capacidade de se antecipar, reage ao processo de pressão e
depois fica refém", diz Testa.
Para o coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Daniel
Cara, as ocupações "são a melhor novidade no debate público
brasileiro". Segundo ele, os estudantes deram um passo além das jornadas
de junho.
Estudantes que participam de ocupações querem mais espaço nas decisões
"Em 2013, havia mais gente mobilizada, mas tinha um ponto que negava as
organizações e as instituições e fazia sentido ali, mas quando se nega
inclusive as organizações que podem ser parceiras, isso dificulta o
processo. As ocupações não fecham as portas para ninguém. São os
secundaristas que têm autonomia e que coordenam o movimento. Acredito
que a maturidade política vem sendo estabelecida e uma nova forma de
exercício de liderança", analisa Daniel Cara.
Segundo ele, mulheres e a
população LGBT [Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e
Transgêneros] têm exercido protagonismo nesse processo, o que é
positivo. "Eles, de fato, mudam o dia a dia na escola, os estudantes se
apropriam do direito à educação. Percebe-se uma liderança apolítica,
mais horizontal, menos discursiva e mais pautada no exemplo".
Em relação à atuação dos governos, Daniel Cara considera que eles têm
agido mal. "Não compreendem essas ocupações e não percebem que
significam uma oportunidade de fazer uma discussão qualitativa da
educação e de fazer com que o jovem se responsabilize e ajude a
desenvolver a gestão democrática", afirma.
O presidente do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed),
Eduardo Deschamps, diz que os secretários veem a situação com apreensão.
"Em primeiro lugar, pelos prejuízos às estudantes por causa das
dificuldades de cumprir os 200 dias letivos dentro do ano. Nesse caso,
os prejuízos aos estudantes, em especial aos do ensino médio, podem vir a
ser irreparáveis. Em segundo lugar, pelas dificuldades de negociação
com o grupo de alunos que ocupam as unidades escolares pois, segundo
relato dos secretários, é difícil encontrar uma pauta clara para
atendimento e discussão, além de, em alguns casos, a liderança ser
difusa e, ao contrário do que prega, se negar ao diálogo".
Deschamps diz que todos os secretários querem garantir a melhor educação
possível aos estudantes. "Porém as soluções são complexas. Temos
observado a ampliação de espaços para que os estudantes e suas
lideranças possam participar do processo de definição das ações
educacionais em cada estado. As novas formas de comunicação, por meio
das mídias sociais, vêm se transformando em ferramentas bem
interessantes de interlocução com os estudantes, como nunca antes foi
possível".
Segundo o secretário, é necessário que haja espaços
abertos de diálogo de ambos os lados. "Os problemas da educação só serão
resolvidos com um grande pacto nacional e não por meio de um ambiente
de conflito permanente".
Fonte: Agência Brasil, em 13/6/2016.
Nenhum comentário:
Postar um comentário